13 de março de 2009

Não existe lugar habitado, por recôndito que seja, cuja população não se tenha formado graças a fluxos migratórios, em tempos recentes ou recuados. Portugal tem sido, ao longo dos séculos, um país de emigrantes.

Nos idos de sessenta do século XX, por exemplo, o país, mergulhado na guerra colonial e no obscurantismo salazarista, conheceu um dos maiores derrames emigratórios da sua história, e o interior do país continua ainda a pagar a pesada factura do despovoamento que daí resultou. Neste início do século XXI, o desemprego e a falta de oportunidades profissionais estão, de novo, a desencadear um fluxo emigratório importante – e transversal, visto que atinge todas as classes médias e baixas. Em 100 emigrantes que circulam, é quase certo menos de 5 serem migrantes por opção pessoal realmente livre.

O abandono da terra natal é um gesto quase sempre ditado pela extrema necessidade. Impossível se torna pois tolerar que, num país de emigrantes, os poderes constituídos e os cidadãos que os elegeram fechem os olhos perante as práticas de ameaça, chantagem e abuso de poder (que podem ir até à usurpação de documentos de identificação) instauradas por um certo patronato esclavagista que se mostra, no mínimo notoriamente crápula, no máximo objectivamente criminoso.

Enquanto vivermos num mundo ferozmente desigual, os homens vítimas da miséria ou da perseguição tentarão, como é humanamente compreensível, encontrar melhores condições de vida sob céus que não os da pátria madrasta. E, para isso, forçarão, como é humanamente compreensível, todos os obstáculos geográficos e entraves legais.

Não há português que não tenha, em si, uma história de arribação ou torna-viagem para contar ou descobrir. Contar e descobrir essas histórias, abrindo-se à ideia de uma identidade complexa, é, antes de mais, não pactuar com a segregação, a precarização e a prepotência de que os imigrantes são vítimas, enquanto trabalhadores, aqui e agora.

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